quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Eu te amo, e não só porquê é Natal ;)

Véspera de Natal, doces, comida, presentes, farinha. Hoje eu mexi com farinha, toquei ela,fazia tempo que eu não tocava uma coisa e sentia ela, sabe, sentir, na ponta dos dedos, macia... Farinha me faz lembrar de uma tia minha, tia Ivone, ela na verdade não era filha da minha avó, não no sentido sanguíneo da coisa, não sei muito bem o que se sucedeu, mas ela foi morar com a minha vó quando era bem pequenininha, e o irmão gêmeo nunca se separou dela, mas não morava na casa dos meus avós. Ela era negra, digo era porque não faz bem um mês que ela faleceu, e digo negra porquê venho de uma família alemã onde todo mundo é branco de olhos e cabelos claros, ou apenas BEM brancos, hehe.

Mas continuando, tia Ivone era especial, as pessoas não davam muito crédito para ela, porque ela falava demais, mas eu amava isso, pois era por ela que eu sabia das coisas de antes de mim, de como minha família vivia, das ocasiões, das festas, das birras das crianças, que ela cuidara de todos os filhos da minha mãe, e dos meus tios, eu amava quando ela começava a falar, às vezes eram as mesmas histórias, mas eu não ligava, ficava a imaginar tudo que ela falava e aquilo para mim era como beber memórias.

Ivone era pobre, suas filhas ainda o são, e pelo que eu soube dos outros, pois ela tinha a grande capacidade de lembrar todas as datas, de tudo, dos outros, e não mencionava quase nada sobre ela, tirando suas doenças e exames, ela sofreu muito na vida, mas sempre foi uma pessoa firme, de opinião.

Ela era baixinha, mancava um pouco para o lado direito, tinha os cabelos bem crespos com rajadas de branco por todo ele, lembro de seu rosto marcado, sua pele às vezes mais escura em um ponto, por queimadura de fornos ou ferro de passar roupa, seu pulso era fino, suas mãos pequenas e gorduchas, ela não era gorda, não, era aquele tipo de senhora que tem suas gordurinhas acumuladas da vida, de duas gestações grandes, mas não era gorda, tinha os olhos tão escuros quanto os de um bicho, com auréolas azuis claras em volta dos olhos, característica das suas cataratas.

Ivone entrava no meu quarto e sempre ficava lá olhando minhas coisas, perguntando como eu estava, e me dando paninhos de presente, sempre que podia. Eu deveria ter ido mais lá. Deveria ter ido mais ao piso abaixo da minha casa vê-la passar a roupa, e conversar mais com ela. Eu deveria ter dito que a amava.

Eu gostava quando a gente ia fazer rosquinha. Limpávamos a pia, estendíamos a massa amarela e enchíamos a mão de farinha, e eu ficava lá, bebendo de suas memórias, ouvindo ela falar de como eu era chata e que não gostava de pentear o cabelo, mas que ficava lindo depois de todo o esforço dela, enrolando as rosquinhas gordinhas na forma, acho que ela também gostava de fazer isso.

Sinto saudades dela, mas é uma saudade boa sabe? Daquela que você aceita que a pessoa se foi, do jeito que ela tava, inchada, com úlceras em regiões de ficar muito tempo sentada, sem lembrar das pessoas, não é um alívio, mas é a felicidade de saber que ela se foi quando foi preciso e que não sofreu por um tempo longo. Só queria dizer que eu lembro dela e enquanto alguém se lembra da gente, isso significa que nós não morremos.

Eu só queria nesse post, post pré-natal, fazer o que a gente realmente deve fazer no Natal, lembrar das pessoas não pensando em qual presente devemos dar, mas, lembrar como foi bom ter pessoas como ela na minha vida, onde a gente se entendia no meio da farinha, onde não era preciso dizer mais nada do que apensa um sorriso. Como é bom ter pessoas na minha vida, quando muita gente não tem ninguém, posso dizer que sou abençoada, pois creio eu ter as melhores pessoas do mundo ao meu lado, e muita gente que me ama e que, acho que o mais importante, que eu sinto isso de verdade.

O ser humano é um ser tão social, que nós agimos da maneira que os outros afetam ou afetaram nossa vida, talvez por isso, por ela, e por tantas outras pessoas, eu não seja tão alienada e consiga ser mais compreensiva com as coisas....só queria agradecer, a Deus, sim eu acredito nele, muito, e a todas as pessoas que ele colocou na minha vida, que me afetam de todas as formas possíveis...mas bem...e só um agradecimento, não há mais nada a dizer.

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